Nesta semana, o Congresso Nacional bateu o martelo sobre o adiamento das eleições municipais
deste ano. Os dois turnos foram adiados para novembro, um intervalo de
pouco mais de 40 dias em relação às datas anteriores. A mudança
influencia todos os prazos eleitorais previstos e, como consequência, o
planejamento dos partidos para a disputa eleitoral pelos Executivos e
Legislativos municipais. Diferentes atores envolvidos nas eleições
concordam na imprevisibilidade de como deve ocorrer a disputa, mas
arriscam projeções sobre os impactos do adiamento.
> Adiamento das eleições: o que muda para o pleito deste ano
Para uns, a mudança nas datas do pleito pode ser um desafio para os
atuais gestores municipais, que ficarão mais expostos à opinião pública
na crise do novo coronavírus. Já outros alertam para as incertezas de
uma campanha em meio à pandemia e avaliam que opositores ganham mais
tempo de organização para as candidaturas.
Depois que a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para adiar as
eleições foi aprovada no Senado, prefeitos e vereadores começaram a
pressionar deputados federais na Câmara, onde a proposta também precisou
ser votada, para manter as datas do pleito. O consenso ocorreu apesar
da resistência de parlamentares do Centrão, receosos de que os atuais
gestores sofressem mais um desgaste.
Crise financeira
Entre os receios, o de novos surtos da infecção nas cidades e
estados, já que a pandemia ainda não está controlada no País. A falta de
sustentabilidade financeira, agravada pelo isolamento social nos
municípios, também deve ser uma preocupação.
“Os municípios estão arrecadando menos e, nos próximos meses, o
orçamento municipal vai ficar menor. Ainda que não seja diretamente
culpa do o prefeito, se começar a atrasar a folha de pagamento, por
exemplo, isto tende a impactar as chances de reeleição”, argumenta o
professor de Ciência Política da Universidade Federal do Piauí (UFPI),
Márcio Carlomagno. “Quanto mais adiante forem as eleições, maior vai ser
o impacto que as pessoas vão sentir em suas vidas”, acrescenta.
No Estado, dirigentes partidários estão atentos à possibilidade de
aumento de desgaste dos atuais gestores por conta da crise provocada
pela pandemia de Covid-19. Presidente do PDT no Ceará, o deputado
federal André Figueiredo aponta que isso pode atingir mesmo aqueles que
não irão disputar reeleição.
Por isso, o parlamentar diz que há uma movimentação no Congresso
Nacional em prol da liberação de mais recursos federais para aliviar a
crise nos municípios. Nos bastidores da aprovação da proposta de
adiamento das eleições pela Câmara, houve negociação de um repasse de R$
5 bilhões aos municípios.
Imprevisível
Sobre o adiamento, Figueiredo acrescenta que ainda é difícil projetar
os impactos futuros. “Tudo vai depender de como a pandemia vai se
comportar nas próximas semanas. Temos que acompanhar como vai ser a
definição da campanha política. Vamos estender o tempo de votação na
urna, estimular campanha virtual. Hoje, tudo que se disser é na base do
‘acho’”.
O consultor da área de marketing político, Bergue Lima, concorda que
os efeitos do adiamento das eleições deste ano ainda são imprevisíveis.
Apesar do desafio imposto pela pandemia aos atuais gestores, ele afirma
que, em alguns casos, pesquisas internas apontam vantagem para os
detentores de mandato. “Para a maioria dos prefeitos que se
posicionaram, que foram para cima durante a pandemia, cresceu a
popularidade”.
Justamente por conta da pandemia, a professora de Teoria Política da
Universidade Estadual do Ceará (Uece), Monalisa Torres, considera uma
mudança no perfil do candidato que tende a ser procurado pelos eleitores
nesta disputa eleitoral. O foco será naqueles que, sendo de situação ou
oposição, consigam dar respostas efetivas para crises. “O que se espera
de um prefeito é que tenha capacidade prática para gerir crises. Então,
nomes com este perfil devem aparecer com mais força nesta eleição”,
projeta.
Na avaliação de Bergue Lima, quem está no Governo pode aproveitar o
tempo a mais para apresentar mais ações de gestão. “Para quem vai tentar
a reeleição, é continuar trabalhando, tentando combater o vírus e
sedimentar o que ele tem”, analisa. Já entre os que fazem oposição, a
perspectiva é de apropriar-se do adiamento das datas das eleições em
nome do planejamento.
Oposição
Presidente estadual do Pros, o deputado federal Capitão Wagner,
aponta benefícios quanto ao adiamento das eleições. “A gente tem mais
tempo para planejar e preparar a campanha, para que a gente alcance os
melhores resultados. Para mim, tem vários aspectos positivos. Antes de
qualquer coisa, é bom para a saúde pública e seguir as orientações das
autoridades sanitárias”, argumenta.
Na avaliação da cientista política Monalisa Torres, o tempo extra até
a campanha deve ser valorizado por candidaturas de oposição. “Este
distanciamento para a eleição foi bom para a oposição, porque vai dar
mais tempo de organizar as estratégias de campanha”, observa. “Quem
estava parado e não podia sair para pré-campanha, vai ganhar fôlego
agora, porque vai se organizar, formular um plano de Governo e saber
vender isso”, concorda Bergue Lima.
Também na oposição, o presidente municipal do PT em Fortaleza,
vereador Guilherme Sampaio, aponta que, para as eleições na Capital,
“não há como dizer se favorece mais o lado A ou o lado B”. Para ele, se
por um lado, diante da pandemia, a base governista terá que “correr
atrás do prejuízo”, por outro, o tempo extra pode contribuir para a
organização, dando “mais tempo para o prefeito organizar a candidatura e
tentar construir um nome (para a sua sucessão)”.
“Mas a verdade é que ninguém (nem situação nem oposição) consegue estar
inteiro na pré-campanha com tudo que vem ocorrendo durante a pandemia”,
pondera.
Campanha
Para o presidente do PSD no Ceará, Domingos Filho, entretanto, a
principal preocupação é a realização da campanha em meio a uma crise
sanitária. “Os eleitores querem o candidato na sua porta, o candidato
quer pedir voto para o eleitor. Então, se não houvesse a prorrogação
(das eleições), o próprio cidadão, embora queira a presença do
candidato, fica preocupado com a Covid”, afirma.
A campanha eleitoral feita presencialmente é uma característica muito
forte da eleição municipal, explica o cientista político Márcio
Carlomagno, e a diminuição disso deve trazer uma dificuldade para os
partidos. “A eleição municipal depende muito do corpo a corpo, do
candidato visitando os bairros, deste contato. Serão os candidatos
capazes de reorganizar as suas campanhas eleitorais?”, questiona.
A vantagem, neste caso, estará entre os pré-candidatos que vinham
ganhando visibilidade nas mídias sociais. Elas, para o cientista
político, devem ser a principal alternativa para a realização de
campanha neste ano. “Quem estiver organizado na esfera digital deve
ficar na frente daqueles que não davam atenção a ela”, acredita.
Comunicação
Neste contexto, pontua Monalisa Torres, a propaganda eleitoral
gratuita na televisão e no rádio também deve ganhar importância. Se nos
centros urbanos e nas grandes cidades o acesso a internet é facilitado,
outras formas de comunicação devem ser utilizadas em municípios menores.
“A internet ainda é uma realidade distante para alguns municípios.
Neles, nós devemos ter um protagonismo das rádios locais, que é uma
forma mais comum de comunicação da população”, argumenta a cientista
política.
“Possivelmente, esses meios ganhem uma importância maior do que a
usual justamente pelo fato de não ter o ‘corpo a corpo’. Mas, nós temos
mais de 5 mil municípios no Brasil, e cada um tem sua especificidade.
Temos que identificar cada disputa dentro do seu contexto”, pondera
Márcio Carlomagno.
Domingos Filho alerta também para o curto período que os prefeitos
terão para entregar a gestão e fazer a transição administrativa com os
sucessores. O dirigente, porém, diz que só vê desgaste com o adiamento
das eleições para aqueles gestores que não tiverem responsabilidade com o
uso do dinheiro público.
Legislativo
O Legislativo também deve ser impactado pelas mudanças causadas não
só pelo adiamento das eleições, como pelas consequências da pandemia.
Quem deseja ocupar uma das cadeiras das Câmaras Municipais já vinha
lidando com as novidades trazidas pelo fim das coligações para eleições
proporcionais, alterando a maneira de pensar as chapas de candidatos a
vereador.
Neste contexto, para cientistas políticos, quem tenta a reeleição
pode ter vantagem. “O vereador é visto como elo entre a Prefeitura e a
sociedade. Então, quem busca a reeleição, acaba sendo mais competitivo
porque já tem serviço prestado, já é visto neste papel de mediador",
explica Monalisa Torres. “(Eles) vão ser menos cobrados do que os
prefeitos, porque o ônus e as responsabilidades acabam sendo vistas como
do Executivo”, aponta Márcio Carlomagno.
Monalisa Torres ressalta, contudo, que o cenário não descarta a
construção de novas candidaturas. “Principalmente de quem tenha
comunicação eleitoral a partir das redes sociais, porque, para o
Legislativo, as mídias sociais talvez tenham um peso maior do que no
Executivo”, afirma.
Fonte: Diário do Nordeste
Postado por Raimundo Lima
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